terça-feira, 29 de março de 2011

Terremoto no Japão põe à prova logística do Wal-Mart

Toru Noda, diretor-presidente do Wal-Mart Japan Holdings, voltava de Orlando, onde acabara de participar da reunião anual de gerentes do Wal-Mart, para o aeroporto de Narita e estava a 30 minutos de aterrissar quando o comandante anunciou: um terremoto gigantesco tinha ocorrido e o avião seria desviado para Hokkaido, a ilha mais ao norte do país.

Noda, de 50 anos, ficou apavorado. A mulher e os dois filhos estavam em Tóquio quando ocorreu o terremoto. "Só depois descobri que ele tinha sido ao norte", disse ele, com olheiras de cansaço. Depois que o avião pousou no Aeroporto de Chitosê, em Sapporo, Noda e os outros passageiros ficaram presos na pista por quase cinco horas sem nenhum sinal no celular. Quando finalmente conseguiram desembarcar, passaram a noite num hotel.

Como todos os gerentes do Wal-Mart Stores Inc. estavam na reunião de Orlando, não havia executivos de alto escalão da varejista no Japão quando houve o terremoto. O Wal-Mart se viu diante de uma situação delicada: 24 de suas 414 lojas Seiyu — nome de sua rede japonesa — ficavam na região de Sendai e Fukushima, no norte do Japão, perto do epicentro. O tremor derrubou os produtos das prateleiras, bagunçando as lojas. Depois, um longo blecaute. Duas lojas foram seriamente danificadas pelo tremor. A empresa não sabia o paradeiro de quase 2.000 funcionários na região atingida.

Na manhã de sábado, um dia depois do terremoto, Noda correu para pegar o primeiro voo para o Aeroporto de Haneda, em Tóquio. De lá, tomou um táxi e foi direto para a sede do Wal-Mart, num edifício achatado de concreto em Akabanê, no norte de Tóquio. Assim que chegou, Noda presidiu uma reunião às 13h com cerca de 20 líderes de equipe. Ele e a equipe praticamente moraram no escritório durante as 48 horas seguintes: ele fez do sofá do escritório sua cama por duas noites. E só conseguiu falar com a família na noite de sábado.

Enquanto isso, no sábado, as prateleiras de suas lojas na região de Tóquio foram esvaziadas pela correria geral para comprar gêneros de primeira necessidade: leite, pão e arroz. "Fui à loja Seiyu em Chofu [no oeste de Tóquio] no sábado depois do terremoto e as prateleiras estavam vazias", disse Yumiko Yoshioka, dona de casa com dois filhos pequenos.

"A cadeia de suprimento do Japão inteiro foi interrompida. Em pânico, as pessoas estavam comprando tudo em Tóquio, onde não houve terremoto. Não tinha nada nas prateleiras", disse Scott Price, presidente do Wal-Mart Asia. "Nunca vi nada igual. Tínhamos um grande desafio pela frente."

Já às 10h de sábado foi estabelecida uma rotina de duas chamadas por dia entre a equipe de Tóquio, a sede regional em Hong Kong e a equipe de emergência do Wal-Mart em Bentonville, no Estado americano do Arkansas. Na região de Sendai e Fukushima, 22 das 24 lojas já estavam distribuindo água e alimentos em seus estacionamentos apenas 12 horas após o terremoto da tarde de sexta-feira, em pequenas mesas em que fora empilhado o que sobrara nas lojas. As filas davam a volta no estacionamento.

Como é o maior varejista do mundo, com mais de 8.300 lojas em 15 países, o Wal-Mart se tornou especialista em reagir a desastre naturais — às vezes mais rapidamente que os próprios governos. O maior exemplo foi durante o furacão Katrina, o desastre natural mais caro da história dos Estados Unidos. A varejista coordena as operações emergenciais na sede em Bentonville, onde uma equipe de especialistas munida de meteorologistas estuda possíveis ameaças e ajuda governos nacionais e locais, bem como grupos de assistência, a preparar planos de contingência.

As lojas do Wal-Mart em Sendai e Fukushima venderam o estoque inteiro dois dias depois do terremoto. O Wal-Mart organizou caminhões para transportar mais produtos para o norte, mas havia um grande problema: como obter gasolina diante da escassez nacional. "Tivemos de bolar métodos extremamente criativos para conseguir combustível", disse Price. No fim das contas alguém do Wal-Mart japonês ficou sabendo que uma multinacional tinha decidido fechar as operações no Japão, permitindo que o Wal-Mart adquirisse seus estoques de gasolina.

Mas o Wal-Mart descobriu na manhã de domingo que os suprimentos de emergência não estavam chegando aos sobreviventes e que teria de agir. Price, que entrou no Wal-Mart em 2009 depois de fazer carreira na DHL, entrou em contato com alguns ex-colegas na empresa de encomendas expressas. Eles conseguiram arrumar um avião, enchê-lo com dez toneladas de água, lanternas, baterias e alguns alimentos na terça-feira, 15 de março. O jato pousou em Narita na tarde de quarta-feira. No mesmo dia, a Força Aérea dos EUA ajudou a distribuir parte da água na região atingida.

Na sexta-feira, 18 de março, o Wal-Mart já tinha conseguido confirmar que 1.885 de seus 1.889 funcionários na região atingida estavam seguros. Mas recebeu notícia dois dias depois de que Kimino Sasaki, funcionário de uma de suas fábricas em Sendai, tinha morrido no tsunami. A varejista conseguiu confirmar no dia seguinte que o restante dos funcionários estava em segurança.

"O Japão perdeu muitas vidas. É um enorme problema, enorme e que ainda vai durar muito tempo", disse Noda, fluente em inglês. "Esse acontecimento realmente uniu o povo japonês."

Vai demorar semanas, até meses, para o Wal-Mart e outros varejistas conseguirem normalizar as operações. A varejista americana tinha acabado de recuperar os resultados no Japão, depois de divulgar prejuízo nos sete anos seguintes à sua entrada no mercado, em 2002. Com 414 lojas, o Japão é o pais da Ásia em que o Wal-Mart mais investiu.

Quarta-feira passada, 12 dias depois do sismo, muitas prateleiras da loja da rede em Akabanê ainda estavam vazias: sem leite e iogurte, embora contassem com pão e arroz. O mais recente pânico de contaminação nos alimentos em Tóquio, o alto nível de iodo radiativo na água da torneira, provocou uma correria para comprar água engarrafada.

"O problema agora é oferta e demanda", diz Noda. "Estamos recebendo menos. Os laticínios e o natô [soja fermentada] continuarão sendo um problema por um tempo."

Mas o alto escalão da varejista está otimista de que algo bom sairá dessa catástrofe. "Sei que [o Japão] vai sair desta mais forte", diz Price, que já morou no Japão e é casado com uma japonesa.

The Wall Street Journal, de Tóquio

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